Bate-papo com autor: um encontro com Daniel Barros

por Patrícia Sarmento

31/01/2019

Este ano promete! Iniciamos 2019 na expectativa de que teremos muito trabalho no tocante as mudanças esperadas na área de Educação, uma boa oportunidade para refletir sobre como está a aprendizagem dos alunos nas escolas brasileiras.

Essa foi uma das intenções do jornalista Daniel Barros ao escrever o livro País mal educado: por que se aprende tão pouco nas escolas brasileiras?. Iniciar o ano batendo um papo com o autor, aqui no escritório da Elos Educacional, foi muito inspirador. Um misto de preocupação e esperança.

Para responder esta questão, Daniel transitou entre dados de avaliações externas e indicadores, como o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes(PISA), Exame Nacional de Desempenho de Estudantes(ENADE), Índice de Desenvolvimento da Educação Básica(IDEB), Índice de Desenvolvimento da Educação do estado de São Paulo (IDESP), e situações do cotidiano das escolas observadas durante seu percurso, como, por exemplo, a descrição detalhada de uma aula de Língua Portuguesa e a atuação de uma professora de Ciências iniciando a aula trinta minutos depois do horário previsto. Uma narrativa permeada pela história da Educação, pelo contexto político, projetos, pesquisas nacionais e internacionais, livros de referência e políticas educacionais no Brasil e no exterior que deram certo. Um livro que qualifica a reflexão em torno da pergunta: por que se aprende tão pouco nas escolas brasileiras?

Logo no início, ao descrever sua experiência como observador do contexto escolar, relacionando com os dados de aprendizagem disponíveis destas Instituições, o autor conclui: “ No Brasil, o quanto um aluno vai aprender pode ser determinado por onde ele vive” (BARROS, 2018, p.41). Qualidade e equidade são temas que precisam de um debate cada vez mais qualificado. Temos muito o que compreender a respeito dessas diferenças, se por um lado elas indicam necessidades, por outro, revelam casos inspiradores que podem apontar direções para a melhoria na educação pública brasileira.

São muitos os aspectos tratados! Uma questão que me chamou muita atenção foi o uso das avaliações de aprendizagem na história do município Sobral/CE. Barros (2018) relata que os professores aplicam testes mensais para identificar o aprendizado dos alunos, caso seja observado quais destes não aprenderam, os alunos passam por reforço escolar, garantindo, assim, o direito à aprendizagem. Sabemos que outros fatores descritos pelo autor, como, por exemplo, planejamento semanal mediado pelo diálogo com seus pares, formação continuada centrada na prática de sala de aula, dentre outros, também contribuem para os bons resultados, destacando o foco na aprendizagem de todos os alunos.

Nessa direção, temos outros exemplos de secretarias de Educação que investiram em sistemas próprios de avaliação, como apresentado na pesquisa realizada pela Fundação Carlos Chagas em parceria com a Fundação Itaú Social no ano de 2012. A pesquisa envolveu quatro sistemas de ensino público do país, são eles: rede estadual do Espírito Santo, e as redes municipais de São Paulo (SP), Sorocaba (SP) e Castro (PR). De acordo com Gimenes, et al (2013), foram levantados os diversos motivos que levaram tais secretarias a criarem sistemas próprios de avaliação. Destaco aqui dois deles: a possibilidade de identificar nominalmente cada aluno e sua respectiva fragilidade e trabalhar os dados nas escolas com mais agilidade e rapidez. (GIMENES, ET AL, 2013). Esses são alguns exemplos de como a avaliação pode estar a serviço da aprendizagem dos alunos, apontando direções para a prática realizada em sala de aula.

Como destaca Sousa (2000), a avaliação contempla diferentes dimensões a depender do uso pelas intenções. São elas: Avaliação de Sala de Aula, Avaliação Institucional, Avaliação de Currículos, Avaliação de Programas Educacionais e Avaliação de Sistemas. Cada dimensão contemplará o método que melhor irá apoiar a tomada de decisão.

A autora chama atenção para a importância da formação dos professores com relação as essas dimensões. É preciso desenvolver nesses profissionais uma atitude avaliativa, mantendo-os em constante reflexão. A intenção é, que o professor identifique a aprendizagem dos alunos, formule hipóteses em torno dessa aprendizagem relacionando com teorias, reflita sobre as prioridades no ensino, identifique estratégias positivas, estabeleça que decisões serão tomadas, desenvolva procedimentos para discutir os resultados com os alunos, observação constante em relação ao interesse dos alunos, utilizar os resultados da avaliação para traçar diagnósticos, compreender a responsabilidade da escola em promover a aprendizagem dos alunos e perceber a diferença que faz a sua atuação buscando avaliá-la constantemente. (SOUSA, 2000, p. 105)

O que Barros (2018) também evidencia em seu livro é o papel fundamental do professor. Para versar sobre a formação dos professores, o autor discorre sobre a história do curso de pedagogia, apresenta dados referentes à carreira, apoiado na pesquisa1 realizada por Bernadete Gatti em 2009. Esta traz para a discussão o conteúdo do currículo das licenciaturas e aponta caminhos para melhorar a qualidade da formação dos professores. Temas como: política de bônus, formação continuada, formação dos gestores, Base Nacional Curricular Comum e educação em tempo integral também estão presentes. O exemplo da Chapada Diamantina é inspirador, vejamos este relato do autor:

Em seguida, o autor explica como funciona o sistema de formação, que se baseia nos resultados de provas de Língua Portuguesa e Matemática, aplicadas anualmente para os alunos da rede municipal, para traçar um plano de formação. São identificados a partir desses dados, as necessidades formativas dos professores.

Aqui, nota-se a avaliação articulada com a aprendizagem e o ensino, indo ao encontro das afirmações de Gatti (2003), “ao avaliar seus alunos os professores estão avaliando a si mesmos, embora a maioria não tenha consciência disto ou admita isto. Ensino e aprendizagem são indissociáveis e a avaliação é intrínseca a esse processo” (GATTI, 2003, p. 111).

Ao olhar para a história da Educação, Daniel nos remete a momentos oportunos que tivemos ao longo do tempo que por opções políticas não conseguimos avançar, o que nos levou a realidade que encontramos hoje. De acordo com o estudo Políticas públicas para a redução do abandono e da evasão escolar de jovens, coordenado por Ricardo Paes de Barros, no Brasil temos em torno de 10 milhões de jovens entre 15 e 17 anos, dentro eles, 1,5 milhão não chega a se matricular no ensino médio, outros 0,7milhão abandona a escola durante o ano letivo e apenas 6,1 milhão de jovens chega a concluir o Ensino Médio, o que corresponde a 59% dos jovens brasileiros. O estudo também revela que a taxa de jovens entre 15 e 17 anos que estão foram da escola permaneceu estável nos últimos 15 anos. Tal situação tem levado o Brasil a perder posição quando comparado ao cenário mundial e 12% dos países já ultrapassaram o Brasil nesse aspecto. Esse é a apenas um dos dados, dentre muitos outros, que podem evidenciar a situação atual do pais no diz respeito a educação.

Não tenho a pretensão de resumir o livro País mal educado: por que se aprende tão pouco nas escolas brasileiras? . Apenas destaquei algumas das reflexões que surgiram a partir do bate papo com o autor. O livro traz uma riqueza de dados, detalhes da história, pesquisas, indicações bibliográficas e bons exemplos. Ao final, fica evidente que há muito por fazer e que precisamos qualificar o debate na escola, junto à comunidade escolar.

É possível traçar bons diagnósticos e definir estratégias assertivas que possam, nesse momento de mudança, orientar a formação dos educadores promovida pelas redes e pelas escolas com foco na prática de sala de aula, de modo que a escola cumpra o seu papel de promotora da aprendizagem de todos os alunos.

Fica aqui o convite! Que tal iniciar o ano levando essa pergunta para os professores de sua escola? Por que se aprende tão pouco nas escolas brasileiras? Como vemos a aprendizagem dos nossos alunos em nossa escola? Como usamos os dados das avaliações? Como podemos melhorar? Certamente o livro poderá enriquecer esse debate. Fica a dica!

  1. GATTI, Bernardete; NUNES, Marina. Formação de professores para o ensino fundamental: estudo de currículos das licenciaturas em pedagogia, língua portuguesa, matemática e ciências biológicas. São Paulo: Fundação Carlos Chagas, 2009.

 

Referencial Bibliográfico

BARROS, Daniel. País mal educado: por que se aprende tão pouco nas escolas brasileiras? Rio de Janeiro: Record, 2018.

BARROS, Ricardo Paes. Políticas públicas para a redução do abandono e evasão escolar de jovens. Fundação Brava/Instituto Ayrton Senna/Instituto Unibanco/Insper. out/2017. http://gesta.org.br/wp-content/uploads/2017/09/Pol%C3%ADticas-p%C3%BAblicas-para-a-redu%C3%A7%C3%A3o-do-abandono-e-evas%C3%A3o-escolar-de-jovens.pdf. Acesso em 30/1/2019.

GATTI, Bernardete. O Professor e a Avaliação em Sala de Aula. Estudos em Avaliação Educacional, São Paulo, 27, jan/jun. 2003.

GIMENES, N; SILVA, V. G.; PRÍNCIPE, L. M.; LOUZANO, P.; MORICONI, M. G. Além da prova brasil: investimento em sistemas próprios de avaliação externa. Estudos em Avaliação Educacional, São Paulo, v. 24, n. 55, p. 12-32, abr./ago. 2013.

SOUSA, Clarilza Prado de. Dimensões da avaliação educacional. Estudos em Avaliação Educacional, São Paulo, n.22 p. 101‐118, jul/dez. 2000.

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Comentários sobre o texto

  1. Edneia disse:

    Parabéns pelo artigo, Patricia!!!

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